29/07/2020 às 12h01min - Atualizada em 29/07/2020 às 12h01min

ABANDONADOS PELO GOVERNO, INDÍGENAS SE ORGANIZAM PARA ENFRENTAR A COVID-19

BOLSONARO E SALLES PASSARAM A “BOIADA”

 

Essas imagens mostram a organização e solidariedade entre os povos indígenas, o Conselho Ingenista Missionário (CIMI) e parceiros nacionais e internacionais, para enfrentar a pandemia da Covid-19 e barrar a contaminação nas aldeias do Brasil. Mesmo depois que o ministro do STF, Luís Roberto Barroso, no início de julho, tenha determinado que o governo Bolsonaro garantisse a saúde dos indígenas, ele segue negligente ao avanço da pandemia e ignora as orientações sanitárias.

Em todo o país, os indígenas criam barreiras para conter a invasão e tentar reduzir a contaminação do coronavírus. O grande desafio das lideranças das áreas próximas aos centros urbanos e praias é “controlar a entrada e saída de turistas, devido às instalações de condomínios, pousadas, resorts e casas de veraneio”, ressaltam os responsáveis pela difícil missão. A situação é mais complicada porque com o isolamento, a renda e os meios de sobrevivência dos povos ficaram comprometidos. Parte do indígenas precisa trabalhar fora das aldeias para garantir o sustento das famílias, mas a venda do artesanato e dos produtos do cultivo na terra também foi prejudicada. 

A ajuda que vem de fora, é muito bem-vinda. Desde março, equipes da Cimi vêm realizando ações para garantir a saúde e a sobrevivência dos povos indígenas e em situação de rua. Nas aldeias de Minas Gerais, Espírito Santo e Extremo Sul da Bahia, foram entregues milhares de cestas básicas, com o apoio do Movimento dos Traballhadores Rurais Sem Terra (MST) que contribuiu com toneladas de alimentos produzidos pela agricultura familiar e camponesa dos assentados da Reforma Agrária. 

 

O cacique Ramon Tupinambá, da Aldeia Tucum, conta que as cestas básicas foram distribuídas de forma coletiva. “Priorizamos primeiro as famílias em situação de maior vulnerabilidade, pois as doações vêm fortalecer as ações que estão sendo realizadas nas aldeias”, explicou o cacique. “Vamos fazer chegar aos indígenas e às famílias carentes. É bênção, graça, solidariedade e fraternidade com aqueles que mais precisam neste tempo de pandemia”, agradeceu o padre Ronaldo Cardoso de Oliveira.

A rede de solidariedade também ajuda no fortalecimento das barreiras sanitárias e nas medidas de prevenção de contágio. Eles entregam kits de higiene com álcool em gel, cobertores para amenizar o frio e  máscaras para proteção individual. Tudo é planejado para incluir os povos indígenas nessa luta em defesa da vida. Foi criada também uma Rede de Comunicação Emergencial, via grupo de Whatsapp, com o objetivo de produzir conteúdo e compartilhar informações. Para facilitar o entendimento, os materiais também foram produzidos na língua dos povos indígenas. O professor de Cultura da Aldeia Imbaúba, em Minas Gerais, José de Araújo Souza, o Deda, fala como tem sido feita a comunicação entre as aldeias. “Sempre passamos para todas as aldeias as orientações de se manter em casa e, quando precisar sair, usar máscara e o álcool em gel”, explica Deda. O cacique Gildo do Amaral Tupinambá, da Aldeia Sirihyba, na Bahia, reforça o pedido: “Fiquem em casa”! 

Enquanto essa corrente de solidariedade se amplia para garantir a vida dos povos indígenas e barrar a chegada do coronavírus às aldeias, o governo Bolsonaro está mais preocupado é em defender os invasores das áreas já garantidas aos verdadeiros donos da terra. Nessa terça-feira, 28 de julho, a diretoria do Ibama pediu a abertura de uma investigação na corregedoria do órgão contra fiscais que participaram de operações que retiraram invasores de terras indígenas, no Pará. As fiscalizações para combater o desmatamento ilegal e os garimpos clandestinos nas terras indígenas das áreas de Cachoeira Seca, Ituna-Itata e Apyterewa foram feitas entre março e maio desse ano. Os garimpeiros foram expulsos porque, além de destruir a floresta, também eram uma ameaça à saúde dos indígenas pelo risco de levar o coronavírus para as aldeias. Logo após a operação, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e o presidente do Ibama, Eduardo Bim, mudaram o comando das operações. O pedido para a abertura das investigações foi feito pelo novo coordenador-geral de Fiscalização Ambiental, Walter Mendes Magalhães Junior, que é um ex-integrante da Rota da PM de São Paulo, que substituiu servidores de carreira. O absurdo pedido foi uma resposta às denúncias que os prefeitos da região fizeram chegar à Presidência da República. Os servidores que são alvos das investigações  prestaram depoimento ao Ministério Público Federal (MPF) e alegaram que a pressão política do presidente Bolsonaro e do ministro Ricardo Salles reduziu a capacidade de fiscalização do Ibama. Foi baseado nesse depoimento que o MPF pediu o afastamento de Salles do ministério do Meio Ambiente. O caso já está na Justiça. Essa investigação do Ibama contra os funcionários que estavam cumprindo as obrigações do que ocupam, só comprova que o governo Bolsonaro está seguindo a sugestão que o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, fez na reunião ministerial do dia 22 de abril. “Precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura da imprensa porque só se fala na Covid-19, e ir mudando todo o regramento e simplificando normas”, disse Salles. A  fala do ministro, que é pago para defender o Meio Ambiente, deixou juristas, ambientalistas e milhões de brasileiros escandalizados com a confissão do desmonte das políticas ambientais. Mais horrorizados devem estar nessa quarta-feira, ao constatar que Bolsonaro e Salles passaram mesmo a “boiada” durante a pandemia. 

Segundo levantamento da Folha de São Paulo, em parceira com o Instituto Talanoa, entre março e maio, foram publicados 195 atos no Diário Oficial da União relacionados ao meio ambiente. No mesmo período, em 2019, só foram 16 atos nessa área. Uma análise mais especializada comprova que as medidas tentam mudar o entedimento da legislação ambiental. Outras, como a reforma administrativa do ICMBio, que administra as unidades de conservação, já foram contestadas pelo Ministério Público Federal. E algumas que têm tudo para serem alvos de investigação do MPF. É o caso de uma instrução normativa 4/2020 do ministério do Meio Ambiente que regula o pagamento das indenizações para as desapropriações no interior das unidades de conservação. No artigo que trata da priorização de indenização para populações tradicionais em reservas ambientais, a mudança abre uma brecha para a expulsão de indígenas e quilombolas das suas áreas. E fica a pergunta: até que ponto a bancada ruralista ajudou a passar a “boiada”?

 

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