Relatórios afirmam que o presidente brasileiro, já acusado de descaso com a Covid, estava envolvido em esquema de peculato. O presidente brasileiro ficou sob mais pressão depois de ser pessoalmente implicado em um suposto esquema de corrupção envolvendo a suposta apropriação indébita de salários de seus funcionários.
Jair Bolsonaro é um populista de extrema direita que admira Donald Trump e que assumiu o cargo em janeiro de 2019 prometendo “libertar para sempre a pátria do jugo da corrupção”. Nesta segunda-feira, 5, no entanto, um importante site de notícias brasileiro publicou uma série de relatórios que ameaçavam minar fatalmente a já tênue alegação de Bolsonaro de ser um conservador de vida limpa. O UOL alegou que suas reportagens, chamadas de “vida secreta de Jair”, sugeriam que ele havia presidido um esquema de peculato conhecido como rachadinha durante seus quase 30 anos como legislador na Câmara dos Deputados, entre 1991 e 2018.
A reportagem do UOL apresentava gravações de áudio, obtidas de uma fonte não identificada, nas quais Andrea Siqueira Valle, irmã da segunda esposa de Bolsonaro, supostamente discutia como seu irmão foi demitido do emprego na Câmara do Congresso de Bolsonaro. “O André causou muitos problemas porque o André nunca devolveu a quantia certa de dinheiro que tinha que ser devolvido, entendeu? Ele deveria devolver 6.000 reais, mas André entregava apenas 2.000 ou 3.000. Isso continuou por muito tempo até que Jair disse: ‘Chega - livre-se dele porque ele nunca me devolve a quantia certa de dinheiro’”.
No Brasil, a prática ilegal e supostamente difundida pela qual os políticos exigem uma fatia dos salários de seus funcionários é conhecida como rachadinha, uma gíria que pode ser traduzida como "divisão salarial" ou "reembolso". O filho de Bolsonaro, senador Flávio Bolsonaro, há muito é perseguido por alegações semelhantes de que ele supervisionou tal esquema durante seu tempo como deputado estadual no Rio.
Em uma segunda gravação obtida pelo UOL, a mulher identificada como ex-cunhada de Bolsonaro diz: “Não é nada que eu saiba. Há muito que eu poderia fazer ... para ferrar com a vida de Jair. É disso que eles têm medo. "
As revelações - que o advogado de Bolsonaro rejeitou como sendo baseadas em "fatos inverídicos e inexistentes" - geraram novos apelos para o impeachment de um presidente que já enfrenta a crescente ira pública por sua resposta anticientífica à pandemia de Covid, que matou quase 525.000 Brasileiros. Três manifestações anti-Bolsonaro em massa foram realizadas desde o final de maio, a mais recente no sábado, quando milhares de dissidentes saíram às ruas após alegações de negociações duvidosas envolvendo a compra de vacinas contra Covid. “A gestão de Bolsonaro na presidência está se tornando cada vez mais insuportável”, tuitou Vem Pra Rua, grupo de direita que teve papel fundamental no impeachment de 2016 da então presidente Dilma Rousseff. Leonardo Sakamoto, colunista do UOL, afirmou que as gravações forneceram fortes evidências de que Bolsonaro presidiu "um esquema mafioso" e que a presidência foi tomada por um "conglomerado do crime". O advogado de Bolsonaro, Frederick Wassef, disse aos jornalistas: "Nenhum esquema de‘ cashback ’jamais existiu por parte de Jair Bolsonaro ou de qualquer um de seus filhos."
Bolsonaro está sofrendo um momento terrível, mesmo para os padrões turbulentos de sua presidência de dois anos e meio, que os críticos dizem ter infligido danos históricos ao meio ambiente, saúde pública e reputação internacional do Brasil. Em março, seu principal rival político, o ex-presidente esquerdista Luiz Inácio Lula da Silva, voltou à cena política, com as pesquisas sugerindo que Lula derrotaria Bolsonaro nas eleições presidenciais do ano que vem. Em abril, o Senado lançou um inquérito parlamentar sobre a resposta da Covid de Bolsonaro, com suas audiências na televisão cimentando nas mentes dos eleitores a responsabilidade do presidente pelo caótico - e, agora, alguns suspeitam, corrupto - tratamento da emergência sanitária. No final de junho, o inquérito ouviu alegações explosivas de que Bolsonaro não agiu depois de ser alertado sobre suspeitas de um acordo de 1,6 bilhão de reais para importar a vacina Covaxin da Índia.
Bolsonaro negou qualquer irregularidade e na semana passada tentou se distanciar das alegações de corrupção no ministério da Saúde, declarando: “Não tenho como saber o que está acontecendo nos ministérios”. Nos protestos de sábado, no entanto, muitos manifestantes carregaram cartazes denunciando o que chamaram de impacto humano mortal da suposta corrupção no governo de Bolsonaro.
"Quem você perdeu por causa de um dólar?" disse um poster, em referência a alegações distintas de que um funcionário do ministério da Saúde pediu propina de US $ 1 pela compra de cada vacina AstraZeneca. O cartaz de outro manifestante dizia: "Bolsonaro atrás das grades agora!" Maurício Machado, garçon de 43 anos que aderiu ao comício, disse: “Ele é corrupto. Ele é um negacionista. Não sou psiquiatra, mas talvez ele seja psicopata.”
Apesar dos crescentes apelos pelo impeachment de Bolsonaro - ao qual o partido de direita Novo acrescentou sua voz na segunda-feira - os especialistas dizem que esse continua sendo um resultado improvável. As avaliações de Bolsonaro estão despencando, mas ele intermediou uma base de apoio robusta, embora caprichosa, no Congresso, incluindo o presidente da câmara, Arthur Lira, que precisaria aprovar os procedimentos de impeachment. “O impeachment não depende da oposição. O impeachment depende de Arthur Lira”, disse Maria Cristina Fernandes, colunista do jornal Valor Econômico. "E Arthur Lira não deu sinais de querer fazer nada."