30/05/2021 às 14h42min - Atualizada em 30/05/2021 às 14h42min

​O VOTO SERÁ ELETRÔNICO!

IMPRIMA-SE E CUMPRA-SE!

 
O presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Luís Roberto Barroso, resolveu encarar as desconfianças – sejam honestas ou sejam malandras – em relação às urnas eletrônicas. Inclusive as levantadas por Bolsonaro. Prevendo uma derrota monumental, Bolsonaro já está criando um culpado que possa justificar um golpe ou algo semelhante, já lança dúvidas sobre os resultados do processo eleitoral de 2022, caso ele não seja o vitorioso. Por antecipação, lança a culpa no voto impresso (espelhando-se no ídolo Trump), caso não haja voto impresso e com possibilidade de auditoria — hipótese que já é prevista com os equipamentos a serem usados.
No Congresso, a questão já virou discussão da tramitação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que obriga a impressão de votos em eleições, plebiscitos e referendos. Diante desses questionamentos, Barroso, também ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), reafirma que o sistema eleitoral brasileiro é auditável do primeiro ao último passo.
“Já passou o tempo de golpes, quarteladas, quebras da legalidade constitucional. Ganhou, leva. Perdeu, vai embora. Trump, nos Estados Unidos, esperneou muito, mas acabou indo para a Flórida, não ficou em Washington”,  afirmou Barroso com bastante ironia. “A democracia tem lugar para liberais, progressistas e conservadores. Nela só não cabem a intolerância, a violência e a não aceitação dos resultados legítimos das urnas”.

Em sua avaliação, qual é o objetivo dos grupos que estão propondo ou defendendo a PEC do voto impresso?
Acho que a principal razão da desconfiança é o desconhecimento de como o sistema é seguro, transparente e auditável. Por isso, estamos tomando uma série de providências para deixar isso claro, com vídeos explicativos e criando uma comissão de observadores externos, que acompanharão cada passo do processo, desde o desenvolvimento do programa até a divulgação dos resultados.

Caso a PEC do voto impresso seja aprovada e julgada constitucional, ela poderá ser implementada já nas próximas eleições?
Se a emenda constitucional do voto impresso vier a ser aprovada na Câmara e no Senado, e sendo validada pelo Supremo Tribunal Federal, o papel do TSE é cumprir a Constituição e as leis vigentes no país. Em boa-fé, faremos o que for possível.

O presidente Jair Bolsonaro diz, sem apresentar provas, que as eleições de 2018, nas quais ele se sagrou vencedor, foram fraudadas, porque ele deveria ter vencido no primeiro turno. O TSE já foi instado a apurar essas alegações?
Eu sou juiz, e o TSE é um tribunal. Lidamos com fatos e provas, não com retórica política. Nunca, desde a introdução das urnas em 1996, houve qualquer denúncia de fraude documentada e comprovada. Se alguém tiver qualquer prova nesse sentido, tem o dever cívico de apresentá-la.

O presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores insistem que rejeitarão os resultados das eleições em 2022 caso não haja o “voto auditável”. Quais são as consequências deste tipo de declaração que coloca em xeque o processo eleitoral?
O sistema brasileiro de urnas eletrônicas é auditável do primeiro ao último passo. O papel da Justiça Eleitoral é zelar pela segurança do sistema. Agora, o país é livre, e as pessoas falam o que pensam. Já passou o tempo de golpes, quarteladas, quebras da legalidade constitucional. Ganhou, leva. Perdeu, vai embora. Trump, nos Estados Unidos, esperneou muito, mas está na Flórida, não em Washington.

Um dos argumentos usados pelos críticos da urna eletrônica é que o sistema não permite recontagem de votos. Isso procede?
Não, é um engano. Há dois mecanismos de conferência dos votos. O primeiro é o boletim de urna, impresso ao final da votação, em diversas vias, que é afixado na seção eleitoral e distribuído a todos os partidos. O boletim de urna traz o nome de cada candidato e a quantidade de votos que recebeu. O segundo mecanismo é o Registro Digital do Voto. A urna eletrônica possui um arquivo que funciona como a velha urna de lona, armazenando todos os votos, sem a identificação do eleitor, naturalmente. Esse registro possibilita a recuperação dos votos para sua recontagem eletrônica.

O TSE está preparado para lidar com a eventual judicialização do resultado das eleições em 2022?
Esse é um dos grandes perigos da introdução do voto impresso: as eleições passarem a ser disputadas nos tribunais e não nas urnas. Veja: em 2020 tivemos mais de 400 mil candidatos. Se uma pequena fração deles resolver pedir recontagem, fazer conferência de votos e contratar advogados para garimpar nulidades, vamos ter centenas ou milhares de processos contestando os resultados. Nos Estados Unidos, onde é caríssimo ir ao Judiciário, Trump propôs mais de 50 ações. Nenhum juiz aceitou interferir. Não tenho certeza de que o mesmo se passaria aqui.

Um dos argumentos mais propalados pelos detratores da urna eletrônica é que países ricos como os que integram a União Europeia e Estados Unidos não fazem uso de um sistema inteiramente eletrônico de voto. Qual é a sua opinião a respeito deste critério para desmerecer o uso da urna eletrônica no Brasil?
As pessoas, como os países, se assustam com assombrações diferentes. Se esses países tivessem tido, ao longo da história, os problemas dramáticos de fraudes eleitorais que enfrentamos por aqui, desde a República Velha, também teriam se preocupado em conceber um sistema imune a esse tipo de desvirtuamento. Ou seja, o voto em papel não era um problema lá. Aqui, sempre fez parte de trapaças, desvios e questionamentos. Parte das pessoas que defendem o voto impresso já fazem com antecedência o discurso do “se eu perder, houve fraude”. Nos Estados Unidos, aliás, o voto impresso não impediu esse tipo de alegação.

Como é possível dar maior transparência para a população a respeito do funcionamento das urnas?
Todos os partidos políticos são convidados, a cada eleição, para acompanharem cada etapa do processo, inclusive com seus próprios técnicos. Geralmente, não comparecem. Mas a Procuradoria-Geral da República, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), a Polícia Federal e outras entidades acompanham cada passo. E estamos criando uma Comissão de Transparência das Eleições, com representantes das universidades, do setor de tecnologia, da sociedade civil e de outros segmentos para, dentro do TSE, participarem de todo o processo, com transparência e segurança.

Da redemocratização do Brasil até hoje, já houve, na sua percepção, tamanho clima de incerteza quanto ao processo eleitoral?
Não creio que haja incerteza quanto ao processo eleitoral. O que há é um cenário político polarizado, com sua retórica própria. A incerteza que sempre deve existir na democracia é sobre o resultado da eleição, que somente se fica sabendo depois da contagem dos votos. O general (Alfredo) Stroessner, no Paraguai, costumava ser “eleito” com mais de 90% dos votos. Entre nós, Castelo Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e Figueiredo foram eleitos sem que houvesse incertezas. Nas democracias, é diferente. A única certeza que eu posso compartilhar é a de que o processo eleitoral é seguro e que vai proclamar quem efetivamente venceu. O resto é espuma e fumaça.

Como o senhor avalia o clima conflagrado que se antecipa para 2022?
Acho que o mundo vive um momento singular de polarização e radicalização dos discursos. Tudo potencializado por campanhas de desinformação e teorias conspiratórias veiculadas nas redes sociais. Na eleição de 2020, conseguimos combater com sucesso as notícias falsas, em parceria com as mídias sociais e agências checadoras de notícias. Apesar desse clima, temos regras eleitorais claras e uma Justiça Eleitoral eficiente. Ou seja, toda essa tensão pode ser absorvida institucionalmente. A democracia tem lugar para liberais, progressistas e conservadores. Nela só não cabem a intolerância, a violência e a não aceitação dos resultados legítimos das urnas.

Leia também no Globo e no Brasil247.
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