03/03/2021 às 07h51min - Atualizada em 03/03/2021 às 07h51min

BOLSONARO NO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL!

QUEM ACUSA SÃO RAONI E ALMIR SURUÍ.

 
Ele obteve a condenação da Total, uma das maiores multinacionais francesas, acusada de explorar menores do Mianmar na construção de um gasoduto em 2005. E há cinco anos, conseguiu que a justiça senegalesa condenasse o ex-presidente do país Hissène Habré por crimes contra a humanidade.
 
É o advogado francês William Bourdon quem acusa Bolsonaro diante do Tribunal Penal Internacional, em Haia, representando os Caciques Raoni e Almir Suruí. Ele denuncia a destruição deliberada da Amazônia contra um povo que já não tem como se defender dentro das fronteiras brasileiras.
“Há uma política muito forte de intimidação de todos que resistem à política de Bolsonaro no Brasil. Se um inquérito for aberto, poderá ser um sinal motivador, principalmente para as comunidades que temos a honra de representar e para todos os atores da sociedade civil, que, corajosamente, tentam conter essa política louca de destruição, de Jair Bolsonaro, quem, para nós, constitui um crime contra a humanidade”.
 
As instituições brasileiras fracassaram em proteger a população, o que reforça as chances de abertura de um inquérito no TPI (Tribunal Penal Internacional), diz o advogado. “Temos esperança de obter um retorno da procuradoria antes do verão (boreal, ou seja, antes de 21 de junho)”.
Em sua entrevista, ele relatou uma onda de apoio internacional à causa que defende desde que apresentou a denúncia ao TPI.
“Essa ação é uma mensagem a todos os agentes do mundo, públicos ou privados, que, contra o interesse comum, contra o futuro da humanidade, contribuem para nos impor uma forma de suicídio coletivo em nome do lucro ou da ideologia”.
 
No contexto internacional que Bourdon descreve como mais favorável à denúncia do crime de ecocídio (destruição de um ecossistema), ele explica as etapas do processo e o que podemos esperar.
 
DCM: Como foi o processo de decisão de denunciar o presidente brasileiro perante o Tribunal Penal Internacional?
William Bourdon: Foi um longo processo. Houve diversos momentos-chave, de encontros com o cacique Raoni. Foi bonito e emocionante encontrar e vê-lo pessoalmente em Bordéus, em setembro de 2019.
O Cacique Raoni estava muito curioso por saber como esse processo poderia ser mobilizado. Eu dediquei todo o tempo necessário para responder a suas perguntas. Em seguida, tive outros encontros com associações, juristas internacionais, videoconferências, etc. Minha gratidão é grande porque sem eles nada teria sido possível.
Este trabalho de preparação, verificação, exploração de documentos abertos, levou quase quinze meses. Foi um trabalho necessário para chegar à denúncia que fizemos à procuradoria do Tribunal Penal Internacional.
É um grande trabalho de equipe, um grande trabalho coletivo.
 
DCM: Um trabalho de quantas pessoas?
W. B.: No meu escritório, três pessoas trabalharam neste projeto com a ajuda da associação Darwin Climax e de juristas franceses, estrangeiros, americanos. Há toda uma galáxia de pessoas que trabalham e investigam a destruição da Amazônia. Foi necessário fazer uma seleção de informações para chegar à denúncia feita à procuradoria.
Eu tenho uma responsabilidade considerável e um orgulho por acompanhar os grandes caciques Raoni e Almir Suruí.
 
DCM: O senhor foi entrevistado por diferentes veículos franceses sobre essa denúncia. Qual foi a reação dos franceses a essa iniciativa?
W. B.: É evidente que não somos indiferentes à onda de simpatia, apoio e encorajamento que recebemos de cidadãos franceses e não somente da França, do mundo inteiro. Recebemos e-mails, mensagens de encorajamento e apoio a esta denúncia.
Por quê? Porque há uma consciência universal de proteção dessas comunidades, um dever absoluto em relação ao pulmão verde da humanidade que representa a Amazônia, que desaparece, e as gerações futuras que respirarão com mais dificuldade sem ela.
É sem dúvida enquanto advogado uma das causas mais poderosas que já recebi.
Vimos nas redes sociais o impacto que ela teve, de uma empatia universal por essa iniciativa.
 
DCM: É a segunda denúncia desse tipo contra o presidente brasileiro perante o Tribunal Penal Internacional. Isso quer dizer que as instituições brasileiras fracassaram em proteger a população do país?
W. B.: Completamente. Há um duplo fracasso na proteção dessas comunidades, da Amazônia, da biodiversidade e das comunidades que habitam nessa biodiversidade.
Há um princípio diante do Tribunal Penal Internacional, que é o da competência subsidiária: os procuradores só devem investigar se tiverem a convicção que as autoridades brasileiras são ou incapazes ou que se negam a processar, o que é manifesto pela ausência de vontade de investigar os crimes denunciados.
Então, nós fizemos um vasto trabalho documental para demonstrar que as autoridades brasileiras, sob a autoridade de Bolsonaro, se mostraram incapazes de processar ou julgar os responsáveis, mas que conduziram uma política de desmantelamento sistemática de todas as instituições e órgãos que protegiam a biodiversidade da Amazônia e estimularam e viabilizaram a eliminação de todos os obstáculos às forças destrutivas e predatórias - do agrobusiness, das milícias - destruindo tudo que havia sido feito pelos governos anteriores.
A política conduzida consistiu em dificultar toda possibilidade de ação. As investigações judiciais foram todas aniquiladas. Apesar da multiplicação de recursos, houve tentativas de intimidação de juízes, ameaças contra grupos que não têm nenhuma possibilidade efetiva de recurso - como membros de comunidades indígenas - perante um juiz brasileiro.
É precisamente no que se baseia, para nós, de modo indiscutível a competência do Tribunal Penal Internacional.
 
DCM: O que brasileiras e brasileiros podem esperar em relação à denúncia que vocês apresentaram ao Tribunal Penal Internacional?
W. B.: É um processo geralmente bastante longo. A primeira etapa para a procuradoria é verificar se é de sua competência. Ela deve se certificar que há elementos suficientes para estabelecer a incapacidade ou recusa das autoridades brasileiras a investigar tais crimes.
Penso que não haverá dificuldades para que a procuradoria se convença de que é de sua competência.
A segunda etapa é a abertura de uma investigação preliminar, seguida de um inquérito oficial. É um percurso. Temos esperança de obter um retorno da procuradoria antes do verão (boreal).
Há uma mudança de procurador programada. Fatou Bensouda partirá no mês de junho. Esperamos a abertura de uma investigação preliminar antes do verão.
 
DCM: Então há uma expectativa de que antes do verão esta investigação possa ser considerada como adequada à jurisdição do TPI?
W. B.: Sim. Há uma política muito forte de intimidação de todos que resistem à política de Bolsonaro no Brasil. Se um inquérito for aberto, poderá ser um sinal motivador, principalmente para as comunidades que temos a honra de representar e para todos os atores da sociedade civil que, corajosamente, tentam conter essa política louca de destruição, de Jair Bolsonaro, que, para nós, constitui um crime contra a humanidade, pois o que denunciamos são crimes contra a humanidade.
Fomos motivados pelo documento de política geral de setembro de 2016 da procuradoria, que anunciava sua vontade de se voltar para os grandes crimes ecológicos.
O Direito não é uma matéria morta, é uma matéria em movimento, que conduz a irrupções, à aparição de novos crimes, de novas responsabilidades. Desse ponto de vista, penso que há uma grande corrente universal para considerar o ecocídio de massa - como o cometido na Amazônia - como constituinte de um crime contra a humanidade no sentido do artigo 7 do Estatuto de Roma, que funda o Tribunal Penal Internacional.
 
DCM: As autoridades políticas a serem processadas e condenadas pelo TPI são até hoje raras. As evidências de crimes contra a humanidade da parte de Jair Bolsonaro são suficientes para que um inquérito seja aberto e que ele seja condenado?
W. B.: Essa representação é feita para que ele seja condenado. É um longo processo. Em crimes complexos como este, a cadência das investigações em Haia não é tão elevada quanto podemos esperar. Caberá à procuradoria apontar todas as responsabilidades, os cúmplices e os co-autores, que, em torno de Bolsonaro, participaram dessa associação de malfeitores no mais alto nível do Estado brasileiro para permitir essa política catastrófica.
 
DCM: Trata-se do ex-ministro Sergio Moro... da ministra da agricultura…
W. B.: Aqueles que foram os grandes cúmplices de Bolsonaro são conhecidos politicamente. Caberá à procuradoria fazer a triagem. Mas é uma escolha política penal, a de determinar aqueles que merecem ser processados ou não, aqueles que por seu poder, sua ação ou inação, participaram dos crimes.
 
DCM: O senhor teria outras considerações a fazer?
W. B.: Penso que se houver uma abertura de inquérito, seria uma mensagem de apoio às comunidades, e esperamos que isso dissuada os autores desses crimes de continuar sua política destrutiva.
Estamos diante de um fato consumado, uma destruição da qual não poderemos voltar atrás. É uma corrida contra o relógio. Essa ação é uma mensagem que se dirige a todos os agentes do mundo, públicos ou privados, que, contra o interesse comum, o devir da humanidade, contribuem a nos impor uma forma de suicídio coletivo em nome do lucro ou da ideologia.
 
Pela cosmologia caiapó, há um mundo celeste do qual provém a humanidade. Os primeiros seres humanos que chegaram à Terra vieram de lá por uma longa corda, igual formigas por um tronco. Isto foi possível porque um homem viu um tatu e o seguiu até que entrou num buraco, que depois foi usado pelas pessoas para vir para este mundo. Também as plantas baixaram do mundo celestial quando a filha da chuva brigou com a mãe, desceu a este mundo e foi acolhida por um homem, a quem entregou as plantas.
Tom
ara que por esse tronco desça a condenação do fascista brasileiro.
 
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