20/08/2020 às 11h19min - Atualizada em 20/08/2020 às 11h19min

​STF REPUDIA O DOSSIÊ DOS ANTIFASCISTAS

INVESTIGAR CRÍTICOS AO GOVERNO ESTÁ PROIBIDO


A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal impôs uma  contundente derrota ao governo Bolsonaro, nessa quinta-feira, dia 20, contra a produção do chamado Dossiê dos Antifascistas que investigava 579 funcionários públicos e cidadãos.
A defesa veemente das garantias constitucionais e da liberdade de expressão foi constante nos dois dias de julgamento da ação movida pela Rede Sustentabilidade que pedia o fim das investigações. A relatora, ministra Cármen Lúcia, foi a primeira a votar, nessa quarta-feira, 19, e pediu a  suspensão do trabalho do ministério da Justiça contra os investigados. A maioria dos ministros viu como “desvio de finalidade” do trabalho da inteligência do governo. “A elaboração de relatórios não é atividade da Inteligência com o uso do aparato em conflito com a ordem Constitucional”, afirmou  o ministro Luís Roberto Barroso. Ele comparou a produção do dossiê à atuação dos órgãos de inteligência da ditadura militar. Irônico, afirmou que “talvez  fossem os fascistas que representassem algum tipo de risco à democracia”.

O ministro Edson Fachin lembrou que o país, em 1988, disse “Nunca Mais”, em matérias autoritárias, ano da proclamação da Constituição Cidadã. Ele e o ministro Alexandre de Moraes criticaram muito a finalidade do trabalho do ministério da Justiça. “Compartilhar isso com comandos da polícia? Não importa se o policial militar, civil, rodoviário, federal, é a favor politicamente de A ou B, se ele vota em B ou C, se ele professa religião ou determinada crença filosófica. Desde que ele exerça corretamente sua profissão, ele tem liberdade", ressaltou Moraes.

O futuro presidente do STF, Luiz Fux, considerou o documento “inócuo” e até chamou de relatório da “bisbilhotagem”. Fux criticou a “cultura do medo” e citou a cantora Rita Lee e Caetano Veloso que cantam há anos “É proibido proibir”, música que Caetano fez na época da ditadura militar. E, sobre esse período, o ministro Fux  disse que o Brasil possui um passado recente de perseguições políticas. Fux também fez questão de citar que, em 27 de julho, a Anistia Internacional divulgou uma nota exigindo “o fim de toda e qualquer investigação secreta e ilegal contra opositores do governo, como a que foi noticiada recentemente sobre 579 servidores federais e estaduais da segurança pública, além de professores universitários críticos ao governo. Tais investigações teriam resultado em um dossiê contendo nomes, fotografias e endereços de redes sociais dessas pessoas”. Ainda segundo a Anistia, “de acordo com o que foi noticiado pela imprensa, o Presidente da República Jair Bolsonaro e o Ministro da Justiça, André Mendonça, seriam os responsáveis por essa medida, que inclui entre as pessoas monitoradas, Paulo Sérgio Pinheiro, ex-secretário nacional de direitos humanos e atual relator da ONU sobre direitos humanos na Síria; Luiz Eduardo Soares, cientista político e conselheiro da Anistia Internacional Brasil e Ricardo Balestreri, secretário estadual de Articulação da Cidadania do governo do Pará e ex-presidente da Anistia Internacional Brasil. A coleta de dados e compilação de informações pessoais contra ativistas de direitos humanos e opositores políticos sob o argumento de “prevenção, neutralização e repressão de atos criminosos” em razão de suas posições políticas fere a liberdade de expressão, inclusive de opinião política. Esse direito inalienável de toda pessoa está previsto na Constituição Federal de 1988 e nos Tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil”, reafirma a Anistia. A nota seguiu conclamando todos defensores dos direitos humanos no Brasil  a repudiar veementemente a perseguição política. “O presidente da República e seus ministros de Estado não devem se prestar a espionar e intimidar seus opositores políticos por meio de investigações secretas e ilegalmente motivadas. Transformar órgãos oficiais em agências privadas de inteligência é intolerável em um Estado Democrático de Direito. Toda e qualquer atividade de “inteligência” do Ministério da Justiça precisa ter por base investigações policiais regulares, motivadas pela ocorrência de crimes, sendo autorizadas e supervisionadas pela autoridade judicial. Caso contrário, consistirá em arbitrariedade, violando os direitos humanos. A Anistia Internacional está vigilante e sempre exigirá do Estado brasileiro o compromisso irredutível com os direitos humanos de todas e todos” - finalizou a nota lembrada pelo ministro Luiz Fux.
O único a votar contra a medida cautelar foi o ministro Marco Aurélio Mello que, inicialmente, era a favor da extinção da ação. De licença médica, o ministro Celso de Mello não participou do julgamento.

O presidente do Supremo Tribunal, Dias Toffoli, também votou com a relatora Cármen Lúcia, pelo fim da produção, investigação e compartilhamento de dados sobre servidores públicos e qualquer cidadão que discorde do atual governo e atue como garante a Constituição Cidadã de 1988. No final, Toffoli surpreendeu e fez questão de defender o ministro da Justiça, André Mendonça, pela transparência das informações e pelo trabalho do servidor que conhece há 20 anos. Enfático, o presidente do STF ressaltou que “ao contrário de outros que entram para governos e depois concorrem a cargos públicos”. Sem citar nomes, Toffoli  resumiu com um ditado: “Para bom entendedor, meia palavra basta”. Será que o recado foi direto para o ex-ministro da Justiça e ex-juiz, Sérgio Moro?


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