02/07/2020 às 18h41min - Atualizada em 02/07/2020 às 18h41min

BARROSO INTIMA BOLSONARO SOBRE A PROTEÇÃO AOS INDÍGENAS

TERENA: “SOMOS OBRIGADOS A OBRIGAR O GOVERNO A NÃO NOS DEIXAR MORRER”.


O presidente Bolsonaro tem até 48 horas para explicar ao Supremo Tribunal Federal sobre a ação que pede que o governo adote medidas para proteger os povos indígenas do coronavírus. O ministro Luís Roberto Barroso ouviu, nesta quinta-feira, dia 2, o pedido de socorro que veio das Terras Indígenas, que chegou ao STF em uma ação protocolada na terça-feira, 30 de junho. O documento denuncia que o coronavírus se espalha pelas aldeias e já  provocou a morte de 380 indígenas e contaminou, pelo menos, 9.414 pessoas. A petição foi feita pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apibi), com apoio do PT, PSOL, PCdoB, PSB, Rede e PDT. Barroso também quer que o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o advogado-geral da União, José Levi, se manifestem. E avisou que, se isso não acontecer dentro do prazo, os autos vão ser encaminhados para a conclusão.
Segundo a ação, o governo federal tem o dever de colocar barreiras sanitárias nas Terras Indígenas (Tis), impedir as invasões e executar um plano emergencial para proteger os povos indígenas, especialmente os isolados, que não têm contato com outras nações e não-indígenas, mais vulneráveis à contaminação  da Covid-19.
A base da petição foi um relatório do Instituto Socioambiental (ISA), que  mostra o avanço das invasões sobre terras indígenas durante a pandemia. O estudo faz um alerta para a possibilidade de aumento dessas invasões no segundo semestre, fenômeno que tem sido tendência nos últimos anos. Garimpeiros, grileiros e desmatadores não paralisaram as suas atividades durante a pandemia. Pelo contrário: elas foram intensificadas. A situação é crítica, pois os invasores estão em constante circulação entre as cidades e as aldeias  e podem levar o coronavírus para esses territórios. A ação pede que o governo instale barreiras sanitárias nas 31 Terras Indígenas com presença de povos indígenas isolados e de recente contato, impedindo a entrada dos invasores. Algumas das TIs vivem um cenário dramático. É o caso da TI Uru-Eu-Wau-Wau. “A disseminação do coronavírus entre os índios isolados da TI Uru-Eu-Wau-Wau representa risco real de extermínio em massa desses grupos. Em razão disso, é urgente que o Estado brasileiro retire os invasores da TI”, aponta o relatório. Também foi solicitada a retirada do invasores das Terras Indígenas Yanomami, Karipuna, Uru-Eu-Wau-Wau, Kayapó, Araribóia, Munduruku e Trincheira Bacajá, que estão entre as mais afetadas da Amazônia brasileira, que enfrentam o avanço das ameaças em cada um desses territórios.
O documento ainda reivindica que todos os indígenas sejam atendidos pela Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena) vinculado ao SUS (Sistema Único de Saúde). Desde o início da pandemia, apenas indígenas que vivem em aldeias estão recebendo atendimento especial. Os que vivem nas cidades sofrem para conseguir atendimento no sistema geral e as demandas específicas desses povos são ignoradas, o que contraria direitos constitucionais dos indígenas brasileiros.


E foi lembrando a Constituição Cidadã de 1988 que o assessor jurídico da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Eloy Terena, começou  um artigo que já no título resume todo o sofrimento e preocupação dos povos indígenas. “Somos obrigadas a obrigar o governo a não nos deixar morrer”.  O advogado começa assim a emocionante defesa do seu povo. “Nasci em 1988, junto com a nova Constituição, quando o Estado brasileiro finalmente nos reconheceu cidadãos. Foi um bem legado a nós pela geração anterior; entretanto, somos obrigados a defendê-lo desde o berço.
Enfrentamos agora o nosso maior desafio. Podemos ser dizimados pela Covid-19; povos inteiros correm o risco de desaparecer. O tratamento dado à pandemia no Brasil tem sido especialmente catastrófico para nós. Por esta razão, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) está tomando uma medida drástica: entramos no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) para obrigar o governo a não nos deixar morrer.
O Executivo tem se especializado nas práticas de acusar o adversário de fazer o que ele próprio faz e culpar o outro pelo resultado de suas omissões. Um dos sintomas do novo coronavírus foi deixar esse “modus operandi” ainda mais evidente. Enquanto responsabiliza governadores e acusa o Judiciário de interferir em suas atribuições, cruza os braços durante a pandemia”. Eloy Terena ressalta que a “taxa de mortalidade pela doença por 100 mil habitantes entre indígenas da região amazônica é 150% maior que a média nacional”. Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) mostra que 48% dos pacientes internados que morrem são indígenas. É a maior taxa de mortalidade do país, superando as populações parda (40%), negra (36%), amarela (34%) e branca (28%).
 Eloy Terena também homenageou  importantes lideranças indígenas  que a Covid-19 levou.
“Entre os mortos que choramos nos últimos dias estava Paulo Paiakan. Ele foi fundamental na conquista de nossos direitos constitucionais; fez parte da geração anterior à qual me referi no início do texto, ao lado de pioneiros do movimento indígena, como Raoni, Mario Juruna e Aílton Krenak.
A Constituição de 1988 foi um avanço civilizatório saudado pela maioria das nações como exemplo a ser seguido; portanto, não apenas uma conquista dos povos indígenas, mas um bem de todos os brasileiros, que por todos deve ser defendido. E o melhor remédio não só contra o coronavírus, como para outros males que há por vir”.

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