31/08/2020 às 09h29min - Atualizada em 31/08/2020 às 09h29min

VOCÊ É A, B, C, D OU E?

A LUTA DAS CLASSES NO HOME OFFICE...


 
O uso do home office foi a grande descoberta desse período pandêmico. Está todo mundo ligado na internet, conectando-se com Deus e o mundo, certo? Alguém tem alguma dúvida sobre isso? Aparentemente, não. Mas a grande verdade é que estamos milhões de gigabytes de distância da realidade.
 
Primeiro, é preciso destacar que apenas cerca de 10% de toda a população ocupada no Brasil estava no sistema home office nesse mês de julho.
Segundo, é preciso destacar também que as regiões do país têm percentuais de utilização do home office bem diferenciados. A fração é maior no Sudeste, com 13% de sua população ocupada atuando no trabalho remoto, e bem menor no Norte, com apenas 4% trabalhando em casa diante de um computador.
 
Em julho, dos 8,4 milhões de trabalhadores em trabalhos remotos (home office), mais da metade, 4,9 milhões, estava no Sudeste, região que concentra os profissionais mais qualificados e apresenta a maior geração de PIB (Produto Interno Bruto). Apenas 252 mil estavam no Norte, fatia mais pobre do país.
 
Isso tudo faz parte do PNAD Covid-19 do IBGE (Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, dedicada a medir os efeitos econômicos do coronavírus, especificamente Covid-19).
 
Cerca de 10% de toda a população ocupada no Brasil estava nesse sistema remoto em julho. A fração, porém, é maior no Sudeste, onde 13% da população ocupada estava no trabalho remoto, e bem menor no Norte, onde apenas 4% trabalhavam em casa diante de um computador.
A parcela também é mais alta na região Sul, onde quase 9% estavam no home-office, e menor no Nordeste, que tinha 7,8% da população.
Aqui é importante destacar que a região Sul tem uma população ocupada menor (13,5 milhões) do que a do Nordeste (17,9 milhões).
 
O Centro-Oeste é um caso a se destacar, porque a força de sua economia é a agricultura - que pressupõe maior demanda por atividades presenciais -, mas, ainda assim, 9% da população ocupada estava em home office.
O interessante é que, pela capacidade de geração de riqueza e renda média, o Centro Oeste está mais próximo do Sudeste e do Sul do que do Norte e do Nordeste.
 
O professor João Luiz Maurity Saboia, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), avalia que os dados do IBGE retratam o que se intui: o trabalho remoto é um benefício adicional para os mais qualificados, especialmente para a parcela que tem curso superior completo. Entre os que estão no trabalho remoto, 6,1 milhões, quase 73% do total, concluíram o ensino superior completo ou uma pós-graduação, detalha o levantamento do IBGE. Por outro lado, apenas 70 mil dos trabalhadores (1,15%) que estão no sistema não completaram nem mesmo o fundamental.
“O home office não é para qualquer um, é para determinadas ocupações e setores”, afirma Saboia – infelizmente, com toda a razão...
 
O pesquisador Daniel Duque, do FGV-IBRE (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas), lembra que pesa também a qualidade do acesso à internet. O fato de o Sudeste ter uma infraestrutura de rede mais ampla e conexões mais ágeis favorecem o teletrabalho na região.
“No Sudeste, a internet chega a um número maior de pessoas e há mais predisposição para se trabalhar em casa, pois isso reduz o tempo perdido no deslocamento, por exemplo”, diz.

Ele destaca ainda que essa região também concentra empresas mais sofisticadas e tem um número maior de trabalhadores qualificados do que o Norte e o Nordeste. O home office mostra-se excelente para medir as distinções entre trabalho formal e informal no Brasil. De acordo com o IBGE, os trabalhadores informais representam 15% – ou 1,3 milhão de trabalhadores – do universo de funcionários em casa. Mas, considerando todo o mercado, são quase 40% da população ocupada no segundo trimestre.
 
O economista Rodolpho Tobler, também do FGV-IBRE, diz que a questão da informalidade talvez explique porque há tão poucos em teletrabalho na região Norte. O absurdo aqui é dizer “talvez”, porque, segundo ele mesmo, o emprego no Norte é mais informal, com ocupações mais difíceis de serem exercidas no trabalho remoto: “As pessoas não conseguem trabalhar em casa - é uma realidade nessa região”, afirma.
 
Os dados da PNAD Contínua divulgados nessa sexta, 28, trazem a informação de que 57,9% da população ocupada no Norte está na informalidade, com destaque para os estados do Pará (56,4%) e Amazonas (55,0%).
No Sudeste, esse número é bem inferior (31,5%). São Paulo tem uma parcela de informais ainda menor (28,6%).
 
Na avaliação de João Luiz Maurity Saboia há outra questão: a natureza do trabalho informal no Brasil, onde ainda prevalecem atividades com baixo uso de tecnologia, não adequadas ao home office.
“Normalmente, são prestadores de serviços na agricultura, nas atividades doméstica e familiar ou ambulantes no comércio de rua. Você precisa estar no local para desenvolver essas atividades”, afirma.

É bom não esquecer também que o home office foi uma espécie de escudo de proteção contra o desemprego para os mais qualificados.
 
Leia também na Folha.
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