12/11/2021 às 07h06min - Atualizada em 12/11/2021 às 07h06min

THE ECONOMIST SOBRE BOLSONARO:

“ELE É RUIM PARA A ECONOMIA DO BRASIL”


Em setembro de 2019 Paulo Guedes, ministro da Economia do Brasil, disse ao Congresso que poderia “fazer história” mantendo o orçamento sob controle, acrescentando que “a classe política não deveria estar perseguindo ministros, implorando por dinheiro”. Agora, Guedes está apoiando uma tentativa dissimulada do governo de contornar o limite constitucional para os gastos públicos estabelecido em 2016, o que foi um passo crucial para endireitar as finanças do país. Ele e Jair Bolsonaro, o presidente, presidem não apenas com um retorno à incontinência fiscal, mas também com outros males econômicos que têm afetado o Brasil: aumento da inflação, altas taxas de juros e baixo crescimento. E as ‘travessuras’ orçamentárias, por sua vez, criaram incerteza sobre o futuro do principal programa social do país.
 
Na eleição de 2018, a aliança de Bolsonaro com Guedes, um economista de livre mercado, fez muito para persuadir os empresários a votarem em um ex-oficial do exército de extrema direita que nunca havia mostrado interesse pela economia liberal. O Sr. Guedes prometeu uma reforma radical do estado inchado e ineficiente do Brasil. Mas essa promessa resultou apenas em algumas economias úteis em pensões, independência legal para o banco central e pequenas simplificações regulatórias. Agora a campanha de reforma acabou, substituída pela corrida de Bolsonaro por dinheiro para comprar apoio político e popularidade.
 
Para evitar o impeachment por sua má gestão da pandemia e dos crimes de sua família (o que eles negam), Bolsonaro se aliou ao Centrão, uma grande coalizão de legisladores conservadores. Quando a Covid-19 atacou, o governo declarou “um estado de calamidade”, permitindo-lhe oferecer grandes ajudas temporárias, apesar do limite de gastos. A pobreza caiu no Brasil em 2020, contrariando a tendência regional, e a popularidade de Bolsonaro aumentou. Em março, o governo ganhou uma emenda constitucional de emergência, abrindo um buraco no teto de gastos, para permitir que pelo menos alguns pagamentos continuassem. Agora, a queda no índice de aprovação do presidente está reduzindo sua chance de um segundo mandato na eleição do próximo ano.
 
Uma nova emenda constitucional abriria mais dois buracos. Isso permitiria ao governo atrasar os pagamentos ordenados pelos tribunais (como o reembolso de impostos cobrados em excesso). E iria explorar um salto recente nos preços, indexando o orçamento ao número de inflação anual de dezembro (provavelmente superior a 10%), em vez de junho (8,4%). Essas mudanças dariam ao governo um extra de R $ 100 bilhões (US $ 18,2 bilhões) para jogar no próximo ano, avalia Marcos Mendes, ex-assessor econômico do Senado.
 
Parte desse dinheiro iria para o Auxílio Brasil, um programa reformulado de combate à pobreza. Isso vai incorporar o Bolsa Família, o bem-sucedido esquema de combate à pobreza lançado em 2003 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas vai acrescentar complexidade e incerteza, observa Marcelo Neri, especialista em pobreza da Fundação Getulio Vargas, um think-tank. O governo elevou a média do benefício permanente em 18%, para R $ 217 por mês. No entanto, Neri aponta que a inflação havia corroído 32% de seu valor real desde 2014. Bolsonaro também prometeu um bônus temporário, de modo que todas as 17 milhões de famílias no esquema receberão pelo menos 400 reais por mês, mas apenas até dezembro de 2022 Não por acaso, isso é logo após a eleição.
 
Outra grande parte do dinheiro extra iria para causas menos dignas, incluindo cerca de 18 bilhões de reais para financiar emendas orçamentárias opacas que concedem contratos de aquisição pública superfaturados a legisladores individuais em troca de seu apoio a Bolsonaro. Essas foram uma inovação idealizada pelo centrão. Esta semana, a maioria do Supremo Tribunal considerou essas cláusulas secretas ilegais. Isso não impediu que a câmara baixa do Congresso aprovasse a emenda constitucional em 9 de novembro. Se isso vai passar pelo Senado, não está claro.
 
De qualquer maneira, haverá custos. A derrota colocaria em dúvida o financiamento do Auxílio Brasil no futuro. Mas a vitória seria de Pirro. Quatro dos assessores seniores de Guedes renunciaram no mês passado porque se opuseram à emenda (a explicação oficial foi por "razões pessoais"). A preocupação com a política fiscal é o “principal combustível da inflação”, diz Zeina Latif, economista de São Paulo. O objetivo do teto de gastos era travar o aumento implacável dos gastos públicos para satisfazer os insiders, que não são redistributivos nem eficientes para superar os gargalos que freiam o crescimento. Seu enfraquecimento mostra que Bolsonaro não é ruim apenas para o meio ambiente, para os direitos humanos e para a democracia, mas também para a economia do Brasil.
 
Este artigo foi publicado na seção As Américas da edição impressa com o título "Seguindo o dinheiro".

Leia em The Economist.

  
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A publicação pertence ao The Economist Group, metade do qual é de propriedade da empresa britânica Pearson PLC, através do Financial Times. Um grupo de acionistas independentes, incluindo muitos membros da equipe e do ramo britânico da família Rothschild de banqueiros, é dono do resto. O conselho de administração nomeia formalmente o editor da revista, que não pode ser removido sem a sua permissão. Cerca de dois terços dos 75 jornalistas da equipe são baseados em Londres, apesar da The Economist ter uma ênfase e um alcance global.
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